Setor da construção civil pede modernização urgente e escancara gargalo de capacitação frente ao avanço tecnológico

Especialistas alertam que falta capacitação para sustentar a revolução digital nos canteiros.

Um manifesto assinado por cinco das principais entidades do setor da construção civil — SindusCon-SP, CBIC, Abrainc, Secovi-SP e Sintracon-SP — colocou em pauta o que executivos e especialistas do setor já sentem no dia a dia: o Brasil precisa modernizar suas legislações trabalhista e tributária para acompanhar a revolução tecnológica nos canteiros de obra.

Divulgado no fim de agosto, o Manifesto da Indústria da Construção Civil 2033 alerta para a urgência de incentivar a qualificação da mão de obra, reduzir a informalidade e adaptar o modelo tributário para estimular a adoção de métodos construtivos mais eficientes.

 O documento destaca que, embora o setor mantenha mais de 3 milhões de empregos formais, cerca de 5 milhões de trabalhadores ainda atuam na informalidade — muitos sem acesso ou preparo para a nova realidade digital que já se impõe.

Essa movimentação encontra eco na experiência prática de quem está na linha de frente da transformação digital nas obras. “A tecnologia deixou de ser um diferencial. Hoje, ela é o que garante eficiência mínima no canteiro de obras”, afirma Bárbara Kemp, fundadora e CTO da Kemp Projetos e Gerenciamento de Obras.

Com atuação em projetos de redes como Renner, O Boticário e Itaú, Bárbara observa que, apesar da presença crescente de sensores de progresso, drones com visão computacional e plataformas BIM com suporte de IA, os maiores obstáculos continuam na base: falta de estrutura, processo e capacitação. “A IA não resolve o caos — ela multiplica aquilo que já está estruturado. Sem uma base sólida, vira só mais uma ferramenta mal aproveitada.”

A Kemp desenvolveu o Workemp, plataforma de gestão usada por empresas como grandes bancos  para centralizar dados, acompanhar cronogramas e antecipar falhas. Mas, segundo Bárbara, a tecnologia só entrega valor real quando acompanhada de treinamento e mudança de mentalidade. “Hoje conseguimos tomar decisões com base em dados consolidados, reduzir desperdícios e garantir previsibilidade. Mas isso só é possível porque investimos em capacitação contínua.”

Os números do setor ajudam a entender o desafio. Um estudo da Deloitte com a Fiesp estima que, entre 2023 e 2025, a construção civil deve perder R$ 59,1 bilhões somente em função de atrasos e falhas operacionais. Já os índices de desperdício de materiais giram entre 30% e 40%, segundo levantamento da Autodesk.

Apesar do cenário desafiador, Bárbara enxerga uma janela estratégica de oportunidade. “O setor está mais aberto do que nunca à mudança. Mas ainda há muito discurso bonito sobre inovação e pouca prática de gestão. A digitalização real só acontece com processos organizados, governança e gente bem treinada”, afirma.

Para ela, o futuro da construção civil será mais colaborativo, conectado e orientado por dados — mas isso exige um novo perfil profissional. “A tecnologia não vem para cortar pessoas, vem para empoderar. E quem entender isso agora vai liderar o setor nos próximos anos.”

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